quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

De Picasso ao labirinto da web


Caballos - Picasso
Caballos - Picasso


Como funciona a experiência de busca por uma informação na internet?
Na imagem acima temos a obra Caballo – de Picasso – um desenho realizado sem a interrupção da linha inicial. Se pensarmos no caminho que se percorre em um labirinto teremos a mesma ideia do desenho acima, como se fosse possível traçar o caminho com uma linha que segue sem interrupção até encontrar a saída. Você pode recuar, errar, voltar o mesmo caminho sem perceber, pode encontrar pistas no meio do percurso ou não, terá que seguir a sua intuição, terá que arriscar... Na web também...
Afinal, como é que se inicia uma busca por uma informação na web? O caminho percorrido entre as páginas, sites, blogs, imagens, as janelas que retornamos, às vezes que nos perdemos... que nos achamos, esse percurso forma um desenho único, cada experiência na web é única, e mesmo quando duas pessoas diferentes procuram por um mesmo termo em um buscador como o Google, por exemplo, ainda assim a experiência será diferente pois os resultados obtidos seguem lógicas baseadas em:
  • Metatags que são informações inseridas no cabeçalho de sites e blogs, elas servem para indicar qual é o conteúdo daquela página e facilitar sua recuperação em uma busca online.
  • Identificação os hábitos dos usuários conforme suas buscas e “cliques” anteriores, registrando essas informações e oferencendo, a partir disso, propagandas que possam interessar a esse usuário.
Ou seja, dois computadores diferentes, duas pessoas diferentes buscando pela mesma informação, irão deparar-se com uma lista de resultados diferentes oferecidas pelo mesmo buscador. Faça o teste você mesmo.
Quem seriam as deusas Ariadnes que nos auxiliam oferecendo um fio para que possamos encontrar o caminho de volta? No mito grego de Ariadne, filha de Minos (Rei de Creta), temos a seguinte situação:
Ariadne apaixona-se por Teseu, que decide enfrentar o monstro Minotauro, guardião de um labirinto cuja lenda dizia que não era possível encontrar a saída, a única saída era a morte ao ser devorado pelo monstro. O Oráculo de Delfos o adverte, ele terá sucesso em sua viagem pois será ajudado pelo amor. “Ariadne, a filha do rei Minos, lhe disse que o ajudaria se este a levasse a Atenas para que ela se casasse com ele. Teseu reconheceu aí a única chance de vitória e aceitou. Ariadne, então, deu-lhe uma espada e um novelo de linha (Fio de Ariadne), para que ele pudesse achar o caminho de volta, do qual ficaria segurando uma das pontas. Teseu saiu vitorioso e partiu de volta à sua terra com Ariadne, embora o amor dele para com ela não fosse o mesmo que o dela por ele”.
A professora em Tecnologias da Inteligência e Design Digital e artista plástica brasileiraLúcia Leão, em seu livro “O labirinto da hipermídia: arquitetura e navegação no ciberespaço”, descreve que “O fio de Ariadne não é só um instrumento para não se perder e poder retornar. Ele é também o instrumento com o qual o viajante consegue avançar. Pois os corredores que ainda não foram explorados não têm o fio, enquanto que aqueles que já foram visitados têm a marca do fio. Os browsers, de uma forma geral, recuperam essa marcação do fio de Ariadne ao marcar os sites já visitados”. A autora continua exemplificando essa caraterística ao nos lembrar que ao clicar em um link o mesmo modifica de cor (torna-se roxo) o que nos indica que já foi clicado, isso nos ajuda a não clicar novamente no mesmo link/caminho por engano. Sem esse recurso ficaria difícil saber o que já percorremos.
No entanto, Lúcia reconhece dois tipos de percursos: o percurso da Ariadne louca e o da Ariadne sábia. A louca é aquela em que se é livre para descobrir novos caminhos, sem precisar do fio, sem precisar de uma lógica única, é um mundo de possibilidades em que se pode mudar o trajeto a qualquer momento. A sábia é aquela que presta atenção no caminho que está sendo percorrido para não perder-se, mantendo a concentração e não se permitindo mudar o trajeto para explorar novas ideias ou estímulos.
Quando iniciamos uma pesquisa online nos deparamos com estímulos diversos, e normalmente mantemos várias janelas abertas, músicas, e-mails, redes sociais, notícias... E é fácil perder-se do objetivo final, mas como dizia Clarice Lispector “Perder-se também é caminho”. Ou porque não relembramos essa famosa citação:
Caminhante, não há caminho, se faz caminho ao andar. Antonio Machado
A teoria da Ariadne sábia inibe o processo de pesquisa e casualidade que ocorre em situação idêntica a uma visita a biblioteca. Você pode querer ficar solto pelas estantes e “fuçar” à vontade, e de repente ser remetido para outros assuntos, autores e o que mais a casualidade permitir. Por outro lado você também pode entrar em uma biblioteca e dizer o que quer e esperar por uma resposta objetiva, rápida e correta. Essa última seria um bom exemplo da teoria da Ariadne sábia.
Mas, a web não é grande demais para permitir-se perder-se por ai à vontade? Temos tempo para isso?
Se pudéssemos entender o tamanho da web talvez esse desenho fosse de grande utilidade:
Superdownloads
Fonte: site Superdownloads

Veja onde está o Google... Ele não está lá na superfície por acaso, na verdade, segundo Ladislau Freitas, a partir de uma pesquisa sobre um estudo feito pela Universidade da Califórnia no ano de 2001, a estimativa é “que toda a Internet apresentada pelos mecanismos de busca corresponde a bem menos de 1% do tamanho real”.
Em uma conversa com o Artista e Webativista Hernani Dimantas a equipe do InovarEduca tentou entender um pouco mais sobre os 99% da web e onde ela está, porque não temos acesso a ela? Realmente não temos?
A Deep Web (ou Dark Net, Free Web, Invisible Web, entre outros termos semelhantes) é um território pouco explorado, mas ele está lá, ele pode ser acessado. Lá estão a web livre, os torrents, o protocolo IRC para comunicação na web e usado para chats e troca de arquivos, o mundo dos hackers...
Imaginem uma imensa livraria, há pessoas que se contentam em parar nas primeiras bancas com os best-sellers, e há aqueles que sabem onde ir, ou que ao menos exploram as prateleiras ao fundo, e há sempre um funcionário que poderá orientar você. Hernani nos diz que a Deep Web é onde estão as networks, e lá não é preciso orientação, uma liderança que indique o caminho, lá é um campo aberto para exploradores que buscam novas ferramentas e compartilham seus conhecimentos.
A maioria das pessoas não sabe como pesquisar, o InovarEduca abordou esse tema em dois artigos: “Aprendendo a aperfeiçoar suas buscas no Google” e “Como escolher as palavras-chave relevantes para o sucesso de sua pesquisa?”. Nesse caso tratamos especificamente do Google, mas a lógica da busca e das palavras-chave se aplica a todo o tipo de pesquisa. Até mesmo uma biblioteca física. Às vezes a resposta a uma pesquisa está errada porque é necessário mudar a pergunta.
Essa inabilidade para pesquisar é um prato cheio para que os search engines possam aplicar suas lógicas baseadas em um grupo líder nos resultados, baseados no que já tratamos acima: metatags e estudos sobre o comportamento do usuário conectado baseado na intenção do marketing, muitas vezes.
Hernani completa dizendo: “As pessoas têm aquilo que elas merecem”. As ferramentas estão à disposição, basta querer, basta explorar, dedicar-se e querer aprender, desenvolver a curiosidade e desacostumar-se a receber tudo pronto. Precisamos nos desvencilhar do pensamento de que se algo não está no Google então não existe. Estamos acostumados a ter um líder, alguém ou algo que nos aponte as referências, mas a experiência do aprendizado, do compartilhamento e da produção de conhecimento exige de nós um novo comportamento: a ousadia, a autonomia, assumir a corresponsabilidade por buscar e disseminar.
Será que sabemos como estudar? Será que sabemos como pesquisar? Será que não estamos muito mal acostumados? Bibliotecários sempre trazem essa questão à mesa quando tratam sobre como os alunos (de qualquer nível, ensino fundamental, médio ou universitário) iniciam uma pesquisa na biblioteca. Já perguntam qual é o livro que possui tal assunto, e com o livro na mão, muitas vezes não se dão ao trabalho de olhar o índice ou o sumário. Como mágica, muitos deles abrem a obra pelo meio esperando que a informação pisque e grite: estou aqui!
Será que basta para a lógica da web um trabalho minucioso de web semântica e de inteligência artificial para satisfazer nossas dúvidas em uma busca online? Ou será que aliado a essas novas tecnologias se faz necessário um trabalho profundo de aprender o que é uma pesquisa, como encontrar referências, a quem perguntar, como entender a lógica de resultados dos buscadores e perceber que não recuperam o conteúdo completamente relevante, mas sim os mais clicados, os best-clicked?

Lygia Canelas
Bibliotecária e escritora


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